Histórico ou Contexto
Em 2000, o então secretário-geral das Nações Unidas Kofi Annan (1938-2018)
lançou o desafio de um Pacto Global, entre as grandes corporações, como
forma de chamar atenção para as responsabilidades coletivas do capital. Havia
urgência, ainda como hoje, de repor o que já tem sido bastante comprometido
pela ganância do lucro de curto prazo. Entendia, o então secretário-geral, que
era hora de trazer ou de criar alguns princípios que pudessem ser universais
para indicar a atuação corporativa em áreas ambientais, sociais e de
governança corporativa. Uma reinvenção moderna para o capitalismo que
passou a ser conhecido como capitalismo consciente e sem mexer na base – o
lucro - defende que quanto mais a empresa cuida – destas 3 áreas – mais ela
ganha.
Em 2005 foi publicado o relatório “ Who Cares Wins” com o compromisso de apresentar indicativos de lucros com o direcionamento para o longo prazo para o retorno de investimentos dos acionistas das grandes corporações. A lógica base do relatório é que em um mundo globalizado, conectado, competitivo, o comprometimento com a gestão sustentável pode trazer lucros também sustentáveis.
E compromisso com a governança (ou gestão baseada em compromissos de
impactos sociais) passa a ser organizada em três áreas: ambiental, social e
corporativa.
Ambiental: mitigar impactos da empresa no meio ambiente. Por exemplo: uso
racional e eficiente dos recursos naturais, diminuição da emissão de gases, de
resíduos poluentes, etc.
Social: assumir governança efetiva em relação aos colaboradores, clientes,
comunidades envolventes.
Corporativa: sedimentar o objetivo no interesse dos acionistas no longo prazo.
Estratégias de funcionamento com foco no lucro, respeitando os dois pilares
anteriores. O ambiente corporativo équo, a prevenção aos atos ilegais,
transparência, inclusão e diversidade no conselho de administração, na gestão
e na direção, oferecem retornos de investimentos e de imagem.
Portanto, investir em Governança Ambiental, Social e Corporativa é
fundamental para os negócios, no médio e no longo prazo. No presente, abre
as portas para novos investimentos e fontes de financiamentos.
2023. Ainda um longo e desafiador caminho a seguir
A Governança Corporativa, no que tange à participação équo nos Conselhos
de Administração, interfere positivamente na consecução de avanços nos
demais pilares da agenda.
O Relatório de 2019 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), avaliou
13 mil empresas em 70 países e apontou uma tendência, que ainda está
desconectada da realidade. 57% entrevistados concordou que a diversidade
melhorou seus resultados financeiros e ajudou a atrair e reter talentos. Já 54%
dos entrevistados viram aumentar a criatividade e a inovação, com a
participação de mulheres na cadeia de gestão. Se os dados confirmam, o que
ainda será preciso vencer para que as corporações assumam efetivamente a
equidade como objetivo?
Na Pesquisa de 2022 da Bloomberg, com 418 maiores empresas do planeta,
lê-se que 31% dos cargos de diretoria dos Conselhos de Administração são
assumidos por mulheres. Estas empresas, 83% delas, dizem ter por objetivo a
contratação de mulheres, nos próximos anos, como estratégia. De acordo, com
a OIT somente quando o mundo corporativo tiver no mínimo 30% dos cargos
de lideranças assumidos por mulheres começaremos a perceber os ventos da
mudança. Entretanto, 60% das empresas ainda não atingiram esta meta.
Uma notícia tímida e que merece reconhecimento: no Brasil, 13 empresas
fazem parte deste pequeno volume com a presença 39% de mulheres em
cargos de diretoria com salários compatíveis. Em Portugal, 8 empresas se
destacam. A realidade é mais desafiadora e o caminho parece não encurtar.
Não há como pensarmos em equidade nos altos postos de liderança sem
mexermos nas estruturas comportamentais e sociais comumente atribuídas ao
ser mulher. Ou alteram-se os mecanismos de exigências dos postos de
comando, adequando-os à realidade diferenciada. Homens e mulheres são
diferentes em quase tudo! Não pode haver regras lineares estabelecidas por
um único olhar. Respeitar as diferenças customizando necessidades e
entregas.
Me parece que talvez a mudança exija-nos dar um salto atrás e alterarmos a
mentalidade individual e coletiva. Antes de tudo, é alteração de mindset. Que
começa com a consciência que não precisamos ser grandes corporações para
começar a agir. Como iniciar o processo? Quem sabe adequar a Governança
no nosso dia-a-dia, no nosso pequeno empreendimento, pequena, média ou
grande empresa. Alterar os paradigmas de milhões de anos não é simples, é
necessária!
No livro Sapiens – História breve da humanidade, o autor Yuval Noah Harari,
conta como nós chegamos até aqui, deuses, capazes de criar, destruir e
recriar. Este movimento de hoje de buscar o equilíbrio, que inicia com a
equidade de gênero nas decisões, é talvez o nosso novo momento de criarmos
algo em cima do caos.
Rijarda Aristóteles, Doutora em História e Presidente do Clube Mulheres de
Negócios de Portugal.
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